Lembro-me de um período em que trabalhei numa universidade, na qual dava aulas três vezes por semana. Nesses dias, quase sempre estacionava no mesmo lugar, usando uma das vagas reservadas para pessoas com deficiência, uma vez que sou cadeirante. Logicamente que a vaga não estava reservada exclusivamente para mim, mas para todas as pessoas com deficiência, desde que disso dessem visibilidade identificando o carro com o selo apropriado. Numa determinada noite cheguei ao trabalho para aplicar uma prova. As vagas estavam todas ocupadas. Observei os veículos que ocupavam as duas vagas reservadas e pude identificar um como sendo de um aluno da universidade, igualmente cadeirante. O outro carro era de uma empresa conhecida na cidade. O vigia da universidade, que me conhecia, aproximou-se e disse:
– Olha, eu não sei quem é esse cidadão, mas ele não tem deficiência. Eu disse que ele não poderia estacionar nessa vaga, mas ele não me deu a mínima!
Depois dessa informação estacionei tão próximo da traseira do carro que estava na vaga de maneira imprópria que não haveria como ele manobrar para sair antes de mim. Desembarquei, dirigi-me a sala de aulas e comecei a aplicar a prova. Passados uns 20 minutos o vigia bateu na porta da sala para me avisar que o dono do carro havia voltado e gostaria de sair. Respondi que assim que os alunos terminassem a prova eu iria tirá-lo. Passaram-se mais de 30 minutos até que, finalmente, todos os alunos terminaram a avaliação. Somente então voltei até o carro. De longe, observava o dono do carro. Lá estava ele com sua pasta executiva numa mão e na outra o celular, falando com alguém. Ele caminhava de um lado para o outro, aparentemente, nervoso. Aproximei-me em minha cadeira de rodas. Ao me ver ele se acercou e pediu-me mil e uma desculpas, dizendo haver chegado atrasado para uma reunião da universidade que deveria ter sido rápida e que agora já estava atrasado para outra reunião. Cumprimentei-o, embarquei no carro, carreguei minha cadeira e fui embora.
Certamente que os compromissos desse senhor eram importantes para ele, assim como os meus são para mim e os seus são para você. Entretanto, isso não dá o direito para quem quer que seja de invadir o direito do outro. E mais. A reserva de vagas para as pessoas com deficiência representa um aspecto legal, proposto, discutido, debatido e regulamentado em lei, além do bom senso comum indiscutível. Em muitas situações não faço questão de me beneficiar das “vantagens” destinadas às pessoas com deficiência, mas especificamente no caso da reserva de vagas de estacionamento sempre busco esses espaços, porque senão meu veículo ocuparia dois lugares. Explico. Os cumpridores das leis sem deficiência não estacionam em vagas reservadas para pessoas com deficiência. Dessa forma, se eu, pessoa com deficiência, estacionar numa vaga convencional e deixar uma vaga reservada sem uso, ocuparei dois espaços. E isso também não é justo, assim como não foi a situação exposta acima.
Enfim, por isso entendo que direitos e deveres estão tão intrinsecamente ligados, reforçando o dito popular que o direito de um vai até onde começa o direito do outro. Nem um centímetro a mais!
Por Moacir Rauber
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